Brasil: punição à propina, já!

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 Ela é a ponta do iceberg que gangrena a nação. A punição é a bandeira mais desejada da nossa pátria, mas tem de ser isenta

 

Edição 124, março de 2017

 

No final de fevereiro, a imprensa internacional noticiou a prisão do herdeiro e mais alto executivo da Samsung, Lee Jae-yong, por corrupção. Mesmo essa empresa representando 20% do PIB da Coreia do Sul, a Justiça do país não deixou de ir até o fim das apurações.

Eike Batista, entrevistado no aeroporto dos EUA, na véspera de sua prisão, declarou que acabar com a corrupção e ter transparência nos negócios seria o melhor para todas as partes. Apesar da ironia da situação, ele sabe o que está falando. A Coreia do Sul, mais ainda.

 

ATACAR A PROPINA É TÃO IMPORTANTE ASSIM?

A corrupção é infinitamente mais danosa que apenas o valor absoluto da propina. A propina, não importa em que porcentagem, é apenas a ponta do iceberg do estrago e prejuízo à nação. Podemos elencar facilmente uma enorme lista de prejuízos diretos, indiretos e subjetivos que a corrupção gera em cadeia, justificando, de forma absoluta e inequívoca, a necessidade de reprimi-la, independente de qualquer custo político ou econômico.

Por exemplo, dentro do nosso segmento imobiliário, que é a nossa especialidade, comprovamos muito isso. Quando um empreendimento de um loteamento fechado é aprovado através de uma propina para alguém, de uma prefeitura local, naquele exato momento está se gerando um prejuízo muito maior que a propina em si. Como um pedregulho lançado num lago, suas ondas atingirão uma área muito maior que o tamanho dele. Aquele “condomínio fechado” mal feito poderá ocasionar, desde danos ambientais irreparáveis, irregularidades no registro cartorário, problemas urbanos e até mesmo danos sociais. Todos os inocentes compradores dos lotes arcarão com prejuízos encobertos sob pena de desvalorizarem o maior investimento de sua família, sua residência. O custo indireto da propina foi enorme.

 

1º PREJUÍZO: FOI-SE O ORÇAMENTO

Agora multiplique esse caso numa dimensão macro. Milhares e milhares de projetos, obras e serviços públicos e privados realizados em todos os níveis e segmentos da economia com baixa qualidade por causa de uma propina. Assim, todo o orçamento público perde-se em grande parte num parque sucateado. Esse prejuízo gigantesco teve seu ponto de partida com aquelas “propininhas”.

 

2º PREJUÍZO: FORAM-SE OS BENEFÍCIOS DOS CIDADÃOS

Mas o estrago da propina não para no gasto do orçamento público, ela ainda gera os prejuízos indiretos das obras mal feitas. Somemos então os milhares ou milhões de benefícios perdidos ou reduzidos que essas obras bem feitas ofereceriam a mais aos cidadãos. Quanto custa a perda desses benefícios, que não realizaram sua plena capacidade? Foi-se o dinheiro e ainda deixamos de receber mais benefícios.

 

3º PREJUÍZO: FOI-SE A MORAL DA NAÇÃO

Mas ainda temos um terceiro tipo de prejuízo da corrupção, que começou lá atrás, com o pecado original da propina. E esse certamente é o mais nefasto e o maior de todos. Trata-se do prejuízo subjetivo, intangível. Alimentada pela impunidade, ela age como uma peste que se alastra e contamina todos ou quase todos os cidadãos. O exemplo da corrupção vem de cima e, num processo sociológico natural, despenca para todas as camadas. A boca miúda se manifesta com as frases “todo mundo lá em cima roubando, só eu vou ser o idiota de ser super honesto?”. “Neste país, se não roubar, você não cresce”. O efeito multiplicador do mal exemplo é espetacular e contagiante, enlameando todos os níveis e segmentos. O prejuízo nacional que começou com a propininha de X%, tornou-se absolutamente imensurável. A moda pega: “vamos todos roubar, ninguém é punido”.

A nação inteira está com uma infecção generalizada a caminho da gangrena econômica e moral. Chegamos ao ponto final, a gangrena moral fecha o estrago de forma monumental. A moral dos cidadãos, do povo, das instituições é atingida em cheio, principalmente a da juventude. Todas as almas são trespassadas pela bactéria da corrupção impune. A ordem vira a desordem, o valor é o desvalor. Instalada a desesperança e a depressão para os mais honestos e, em oposição, grande ânimo e poder aos desonestos. A nação e seu povo estão derrotados. Zumbis, a mercê do diabo ladrão.

 

A CLAMADA BANDEIRA DA PUNIÇÃO TEM DE SER ISENTA, APARTIDÁRIA

O Jornal Le Monde encerrou seu artigo recente sobre a corrupção no nosso país tentando explicar aos franceses a força da “pizza” no Brasil. Um grande exemplo de humor negro realmente inexplicável para um povo sério. Mas nosso Brasil também tem gente séria e muitos hoje são juízes, promotores e policiais, os quais, pela primeira vez na nossa história, empunham com vigor a bandeira mais sonhada da nossa pátria: a da punição. Mas atentem eles e todos, essa sonhada bandeira da punição só será permanente e uníssona se for isenta, independente e apartidária. Só assim terá o apoio de todos os bons gregos e troianos.

A história comprova que dezenas de países superaram coisas muito maiores que a corrupção endêmica! Superaram guerras, flagelos naturais, terrorismo, narcotráfico e doenças, hoje são países vigorosos e alguns são líderes mundiais. Porque então o Brasil sucumbiria apenas por combater todos os maiores inspiradores da corrupção nacional, exatamente o seu maior flagelo? Quem ousa dizer isso?

O nosso Supremo Tribunal Federal sabe disso tudo, sabe do seu momento histórico, sabe que poderá escrever agora sua página de ouro e eterna.

Nós e o mundo devemos acompanhar e reagir diante deste momento épico que significará o fim da insuportável bandeira brasileira da impunidade. Não somos utópicos querendo banir a corrupção no país, mas precisamos de um basta a este demolidor, contaminador e predominante exemplo de corrupção que vem de cima.

 

DIRETORIA ASCONHSP